“― Cê lembra quando nós éramos crianças?
A gente andava de mãos dadas, dormia na mesma cama; e
ninguém via maldade em nada.
― É. Mas isso porque a gente era menina. Se a gente
fosse menino, era o maior bafom.
―É, parece que as meninas tem mesmo um alvará para
expressar os sentimentos.”
(As
Brasileiras)
No
episódio dessa semana, a série As
Brasileiras trouxe para a sua pauta o
homossexualismo. Na narrativa, a protagonista, interpretada pela
cantora Sandy, ouve sua mãe comunicar que está namorando uma
mulher. A reação da garota é ignorar sua genitora e renegar o seu
relacionamento lésbico. Em um dos momentos da trama (marcada pelo
discurso contra a intolerância) acontece o diálogo aqui tomado por
epígrafe.
Nem
preciso me estender em exemplos muitos e argumentos intermináveis
para expressar o quanto o convívio social é marcado pelos
estereótipos. Pelo preconceito. “Pre-conceito”, aliás,
que quer dizer opinião “preconcebida”. Pensar algo sobre
alguém (ou alguma coisa) sem um conhecimento prévio acerca do que
se faz o julgamento. E assim, sob a bandeira da arrogância, a
sociedade segue criando seus tabus e sobrevive em função deles.
Como citado na conversa entre as duas moças, ninguém via maldade
quando duas meninas amigas eram vistas andando de mãos dadas, ou
dormindo juntas. Todavia, se um menino encontra um amigo na rua e o
abraça afetuosamente é olhado torto pelos “juízes da
indecência”. Que absurdo. Passei a minha infância inteira ouvindo
que homem não chora, não abraça, não ama. E não eram os meus
pais que me diziam isso (tenho pais maravilhosos, diga-se de
passagem), mas as pessoas que encontrava na rua. E o pior de tudo é
ver que com o passar dos anos, e com toda a evolução do pensamento
humano, esses tabus continuam ditando o comportamento de nossas
crianças e de nossos homens também. Ao dizer “homens” cito
inclusive mulheres que se deixam entorpecer pelo falar infame da
multidão.
Estereotipar
parece ser o “esporte da vez”. Acabamos criando padrões
(preconceituosos, não esqueçamos) para todos os tipos e rostos. Um
homem sujo e mal vestido é um mendigo. Se for mal encarado é
ladrão. Sele ri muito é “veado”; se ri pouco é mal
amado. Desse modo, vivemos criando e recriando rótulos aos nossos
semelhantes. Será tão difícil concluir que o homem sujo pode ter
sofrido algum tipo de acidente, ou que o de pouco riso é
introvertido? Por que é tão mais fácil postular o risonho como
gay, ao invés de feliz? E se for gay, qual o problema com isso? E se
não for, qual o problema também? Acontece que nos tornamos cada vez
mais “donos da vida alheia” e nos julgamos sempre os arautos da
moral e da verdade.
Fico
intrigado quando me deparo com um menino prendendo o choro, ao sentir
dor, porque aprendeu que homens não choram. Pasmo diante do jovem
que se recusa a abraçar um irmão (ou amigo) para não agir como um
boiola. Não consigo
expressar a consternação sentida por mim diante de um “Eu te amo”
não dito, por que havia outras pessoas olhando. É triste. É muito
triste ver homens sem se abraçar, sem expressar o quanto amam seus
amigos, ou pais, ou filhos só porque são “iguais”. Sim, são
iguais no sexo, é verdade. Assim como são iguais no sentimento, e
assim como são iguais na dor. Homem chora sim. E chora muito, se
quer saber. Chorar ou não chorar (amar ou não ou não amar) não
fará do homem mais ou menos homem. O que fará esse homem menos do
que ele é será o seu caráter, e não a sua emoção. Que fique
claro, portanto, a necessidade que todos temos de amar e de ser
amados, independente de como seja esse amor e de qual maneira se
manifeste. Homens, mulheres, meninos e meninas, todos somos feitos
para o amor. E o amor é o que nos faz humanos, nada mais que isso.
Todo o resto é pura invencionice insana de quem não tem mais a quem
amar.
Deiglisson
Santana
Recife,
27 de Abril de 2012